Nosso amanhecer nos pegava já sorrindo! O sol, com seu brilho, não afetava nossos olhares querendo nos fazer evitá-lo. Ele se espalhava por toda parte, no jardim com seus canteiros floridos, no pequeno quintal de nossa casinha, nas varandas...; e penetrava intrometido pelas frestas das janelas e portas, dando um toque especial em todo o interior, não só da casa como de nossas almas... Em seguida, projetava-se sobre nossos desejos e sonhos que poucos não eram. O da procriação predominava nessa época e percebíamos novas vidas como os casulos do jardim deixavam a todos antever!
Ríamos, juntos, das figuras disformes formadas pelo chão, em direção às quais nosso peludo cãozinho, este sim assustado, latia e rosnava. O colo o acalmava e ele, agradecido, passava a linguinha em nossos braços, lambuzando-os carinhosamente.
Um bem-te-vi, todo faceiro-este sim sem medo-mergulhava nas águas mansinhas da pequena piscina à frente do jardim, bicando suas penas, como que para se molhar melhor, e voltava ao muro coberto de hera, onde a brisa não conseguia soprar, espreguiçando-se e sacudindo as pequenas asas para borrifar à sua volta o excesso de água clorada.
Tudo resplandecia felicidade. Saíamos a passeio, brejeiros como borboletas que já se iniciavam em pequenos voos, de galho em galho, colorindo o verde da natureza, na esperança de encontrar amigos que dividissem conosco novidades sempre benvindas e agradáveis, que nos permitissem sentir o mundo exterior, a vida lá fora, como partes dele e dela que queríamos ser.
As tardes quentes - tônica de nossa região - vinha, aos poucos, chegando, aquecendo ideias, pensamentos, sentimentos e planos.
O amor não conseguia descansar, nem cochilar - tão forte sua energia preparando-se para a vida intensa que a noite invariavelmente trazia.
Noite sem escuridão!
Da janela olhávamos ansiosos pela queda de alguma estrelinha para expressar nossos pedidos, e tornar realidade sonhos latentes. Só certezas povoavam nossas mentes. Mentes jovens e otimistas que se sentiam como folhas novas e verdes sobre rios, ao sabor da correnteza. Não importava se saberíamos boiar... Uma brisa fresca - aqui sim, leve e perfumada - os dirigia o rumo, sem qualquer timão ou proa, levando-nos sempre ao lugar certo, perfeito.
A noite se fechava coroando-nos como majestades sem trono, sem manchar nossa felicidade.
Tempos idos que não retornam mais!
Este artigo reflete, única e exclusivamente, os pontos de vista e opiniões do(s) seu(s) autor(es) e não as da Associação Brasileira de Educação - ABE que, portanto, não é responsável nem poderá ser responsabilizada pelas informações acima ou por prejuízos de qualquer natureza causados em decorrência do uso de tais informações.