Em março de 1990, os participantes da Conferência de Jomtien firmaram um importante documento – Declaração Mundial sobre Educação para Todos. Em seu preâmbulo registraram que “admitindo-se que, em termos gerais, a educação que hoje é ministrada apresenta graves deficiências, faz-se necessário torná-la mais relevante e melhorar sua qualidade, além de torná-la universalmente disponível.”
Ainda neste mesmo documento, no artigo referente aos objetivos, lê-se que “cada pessoa, criança, jovem ou adulto deve estar em condições de apresentar as oportunidades educativas voltadas para satisfazer suas necessidades básicas de aprendizagem.”
Vinte e três anos se passaram. Revivendo as ações desenvolvidas pelos governos federal, estadual, municipal e pela iniciativa privada, concluímos que, se o Documento fosse escrito hoje, o preâmbulo seria o mesmo, embora, em termos quantitativos, tenhamos melhorado, não conseguimos oferecer a escola ideal.
A escola ideal, e não a possível, tem que se preocupar não só com a melhoria da qualidade do processo ensino e aprendizagem, o que já se constitui em um grande desafio, pois sabemos que nosso ensino, atualmente, carece de qualidade em todas as etapas da educação básica e no ensino superior; mas com os demais aspectos referentes à educação, não só a escolaridade, e que poderiam ser sintetizados em assegurar a todos, a formação indispensável para o exercício da cidadania e a preparação para a vida produtiva.
A escola ideal é aquela que oferece os instrumentos e conteúdos essenciais para uma aprendizagem de qualidade necessária para que os indivíduos possam desenvolver plenamente suas potencialidades, possam trabalhar com competência, viver com dignidade, participar plenamente do desenvolvimento, melhorar a qualidade de vida; saibam tornar decisões fundamentais, continuem aprendendo, uma vez que a aprendizagem é um processo permanente e contínuo.
Mas não só. A escola ideal é aquela que confere aos membros de uma sociedade a possibilidade e a responsabilidade de respeitar e desenvolver sua herança cultural e lingüística, de defender a causa da justiça social; de proteger o meio ambiente; de ser tolerante com os sistemas sociais, políticos e religiosos diferentes dos seus; de assegurar o respeito aos valores e aos direitos humanos; de participar do esforço para garantir a paz e a solidariedade, num mundo cambiante e interdependente.
A escola ideal deve ter compromisso com a formação moral e ética, pois são valores por meio dos quais, os indivíduos e a sociedade encontram sua identidade e dignidade.
Como se vê, a escola ideal, além de garantir as condições básicas ao processo educacional tem que oferecer e garantir as condições ideais para a formação de um indivíduo útil a si mesmo e à sociedade, portador de uma bagagem de conhecimento, competências e habilidades e de uma escala de valores morais e éticos que lhe permita competir com conhecimento e lealdade, ter acesso a uma vida de qualidade; saber viver num mundo marcado por permanentes avanços e consequentes transformações; com capacidade de ler, discernir e interpretar a avalanche de informações disponíveis, proporcionada pelas diversas mídias.
A escola ideal é aquela que o Brasil almeja e precisa.
Definí-la, descrevê-la é um exercício fácil. Oferecê-la é um grande desafio, que, por ser grande não deve deixar de ser perseguido, pois ter uma escola ideal é imprescindível, embora concretizá-la num país com as dimensões continentais do Brasil, e com as grandes diferenças regionais é tarefa gigantesca que exige conscientização, determinação e continuidade de esforços.
Para alcançar esta meta, faz-se necessário, como dizia Paulo Freire, “ter um pé no concreto e outro na utopia e uma sã loucura impulsionando um sonho.”
O proeminente papel do professor e demais profissionais de educação no provimento de uma escola ideal deverá ser reconhecido e desenvolvido de forma a otimizar sua contribuição.
Para isso será preciso transformar o discurso que enfatiza a importância de seu papel em ações concretas, que começam por sua formação, passam pela melhoria das condições de trabalho, continuam por sua capacitação e crescimento em serviço, a fim de mantê-los permanentemente atualizados e para que tenham sua prática docente aperfeiçoada, que garantam remuneração condigna, condições indispensáveis para permitir aos docentes, gestores, supervisores, orientadores, coordenadores a plena satisfação de suas obrigações sociais e responsabilidades éticas.
Afinal, sem essa escola, todos os ideais de justiça social vão se transformando no pesadelo que já tanto inquieta a Nação, afunilando os horizontes de cidadania para tantos jovens, adolescentes e crianças.
E, parafraseando Paulo Freire, procuremos todos oferecer nossa cota de contribuição para que essa utopia tão necessária impulsione nossos sonhos, materializando-os no concreto da escola ideal.
Educadora
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