Nessa campanha eleitoral ficou claro que as lideranças políticas nacionais não têm proposta em matéria de educação. Só nos ofereceram “mais do mesmo”: mais prédios como os que já temos; mais aulas como as que já temos, e das mesmas matérias – sempre ressalvado o direito de inventarem outras; mais professores sendo preparados para amanhã como foram preparados os formados ontem. E, é óbvio, melhores salários, mais acesso à universidade e, sempre, muitas escolas técnicas – para estas até parece que já está tudo preparado: instalações, professores, tudo. Só falta a famosa “vontade política” para que elas surjam, resplandecentes. Um espetáculo de voluntarismo.

          Está assim aberta a porta para mais um período de desconversa. Novamente teremos a política educacional servindo de cabo-de-guerra para todo tipo de interesse organizado a seu redor: reivindicações sindicais, luta de diferentes segmentos por recursos escassos, disputa entre setores em busca de mercados ou nichos, e enfrentamentos diversos fantasiados de posições ideológicas.

          Os organismos de estado, responsáveis por pensar a educação do país a longo prazo, estão divididos em representações diversas, e têm dificuldade de ir além disso: escola pública versus escola particular e os seus respectivos magistérios, graus de ensino cada um a puxar a brasa escassa para a própria sardinha, Ministros, Secretários e Conselheiros lutando pelos seus 15 minutos de fama. Tudo isso entre esta Lei de Diretrizes e Bases e a próxima, a décima primeira – que já se sabe não irá tardar magnífica e salvadora como suas antecessoras. Perdidas na confusão, organizações privadas bem intencionadas tentam ajudar pontualmente, meio que a esmo, por falta de objetivo nacional claro.

          E no próximo ano comemora-se o cinqüentenário da primeira Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional, lei que a Constituição de 1946 arrola entre as competências privativas da União, votada dezesseis anos após sua promulgação.

          Para a educação de um país 50 anos não é muito tempo: são apenas duas gerações. Mas o salto que demos já é enorme: um menino, nascido no sertão, cujos pais tenham tido pouca escola – ou escola nenhuma – tendo migrado para outras terras conseguiu preparar-se bem ou mal, é hoje avô de um neto que já nasce com escola assegurada e a seu alcance – e pode até se chamar Lula e estar no final de seu mandato de presidente da república.

          Tudo influiu para isso: com a industrialização veio urbanização, e essa abertura de novas fronteiras impôs que o acesso ao saber fosse generalizado. Não da forma nem nos padrões idealizados pelas elites para a formação de seus filhos, mas pela necessidade imposta por realidades outras. O que parece impedir que se encontre razões para fazermos ainda melhor sem desfazer do que já se fez.

          Nós educadores temos também uma parcela de responsabilidade. Se as lideranças políticas nacionais não têm proposta, é certo que também nos dividimos a um ponto muito semelhante à paralisia, e entregues a assembleísmos ordenados para que as decisões precedam as discussões.

          Nesse quadro de abandono do essencial entregamo-nos a gratuidades. Não é assim de espantar que o Conselho Nacional de Educação proponha a censura a um livro de Monteiro Lobato, “As Caçadas de Pedrinho”, a pretexto de conter insinuações racistas. Aguardamos para breve o mesmo tratamento para “O Saci”, por motivo semelhante, e para um seu personagem, a malvada Cuca – aí até com melhores razões.

 

Edgar Flexa Ribeiro

Presidente