A Lei Federal 12.244, sancionada em maio de 2010, determinou que todas as instituições de ensino público e privado deveriam ter uma biblioteca com pelo menos um livro por aluno, e delimitou um prazo para que todas as escolas se adequassem à nova legislação - 2020.

 

            Em 2010, época da promulgação da Lei, o percentual de escolas públicas e particulares de ensino fundamental que possuíam biblioteca era de 35% e, no ensino médio, de 72%. No ensino fundamental público, 43% dos alunos estudavam em escolas sem biblioteca. Em âmbito nacional, as escolas municipais eram as mais deficitárias, apenas 22% delas contavam com acervos organizados.

 

         A meu ver, o dado referente às escolas possuírem biblioteca tem que ser visto com certa reserva. Não sei se a pesquisa realizada, perguntou quantas funcionavam, porque conheci muitas escolas que possuíam biblioteca sem qualquer uso para alunos e professores.

 

         O Censo Escolar de 2012 mostrou que foram implantadas 317 bibliotecas em escolas de ensino fundamental e 650, em escolas de ensino médio.

 

          Quem conhece a realidade das escolas públicas brasileiras de ensino fundamental e médio sabe que a maioria delas não dispõe de local disponível para implantar uma biblioteca e não dispõe em seus quadros, de um bibliotecário para colocá-la em pleno uso, como exige o Decreto 56.725, de 1962, que regulamentou a profissão, e determinou que toda biblioteca fosse administrada por um bacharel na área.

 

Atualmente, cerca de 34 mil bibliotecários atuam no Brasil, segundo dados do Conselho Federal de Biblioteconomia; número consideravelmente inferior às mais de 192 mil escolas públicas e particulares do ensino fundamental e médio.

 

De acordo com os dados levantados pelo Censo Escolar de Educação Básica de 2013, apenas 10% dessas escolas têm bibliotecas bem estruturadas e atuação de bibliotecários devidamente registrados nos Conselhos Regionais de Biblioteconomia.

 

Diversas iniciativas da sociedade civil vêm atuando com o objetivo de mobilizar agentes públicos, prefeitos, governadores e gestores de escolas a cumprirem a meta prevista na Lei Federal 12.244/10. Uma delas é a campanha "Eu quero minha biblioteca", realizada pelo Conselho Federal de Biblioteconomia, Academia Brasileira de Letras, Instituto Ecofuturo, Fundação Nacional do Livro Infantil e Juvenil, Instituto Ayrton Senna, entre outras organizações.

 

Sou, como a grande maioria dos educadores, uma defensora da formação de leitores.

 

O hábito da leitura, seja na linha de formação ou de informação, seja na linha de recreação ou da pesquisa é um padrão comportamental cultural indissociável a todas as sociedades desenvolvidas. É um indicador do grau de desenvolvimento de um povo.

 

         O hábito da leitura, além de ter reflexos na escrita - escreve bem quem lê muito - leva o indivíduo a um grau maior de informação e amplia seu horizonte cultural.

 

        A análise de indicadores culturais dos países desenvolvidos mostra a importância que é conferida à difusão e promoção cultural. Desde cedo são desenvolvidas nas crianças quer nas escolas, quer em suas casas o hábito e o gosto pela leitura. A família lê, os professores lêem, os pais e professores levam as crianças e os adolescentes a museus, exposições, cinemas, teatros, bibliotecas públicas, casas de cultura, feiras de livros.

 

           Como fazer para desenvolver o hábito da leitura nas escolas onde não há espaços adequados para criar uma biblioteca?

 

           Vivi isto de perto, quando fui Secretária de Educação e Cultura da Cidade do Rio de Janeiro.

 

         Numa rede de 800 escolas de ensino fundamental e de educação pré-escolar, poucas dispunham de espaços adequados para criação de bibliotecas, mas muitas dispunham de acervo de livros em armários, quase sempre fechados, aos quais os alunos não tinham acesso.

 

        Por não possuir bibliotecários formados entre os 30 mil professores, comecei por designar um professor ou dois para todas as escolas, dependendo do número de alunos, como "responsáveis pela biblioteca", para abrir os armários, verificar se o acervo existente era adequado ao interesse do alunado e apresentar uma proposta de como os livros existentes poderiam ser utilizados pelos alunos, para que todos se tornassem íntimos dos livros e da leitura, despertando um novo prazer, dando liberdade para que os alunos escolhessem o livro que desejavam ler.

 

Os livros não podem ficar só numa prateleira, numa estante ou num armário. Eles precisam estar nas mãos dos alunos, fazer com que eles sintam o prazer de folheá-los, de sentir seu cheiro, de admirar suas ilustrações, de ler o que suas letras contam, informam. Ninguém nasce leitor, mas as crianças bem estimuladas e orientadas podem se tornar leitores assíduos, podem adquirir o gosto pela leitura.

 

Foi um trabalho que deu certo. As mais variadas maneiras de utilização dos livros aconteceram.

 

A Secretaria Municipal de Educação e Cultura do Rio, no período de 1975 a 1979 adquiriu expressivo número de livros indicados pelos professores das turmas e pelos responsáveis pelas bibliotecas escolares.

 

A par desta ação, a Secretaria de Educação do Rio reaparelhou as 17 Bibliotecas Regionais existentes, aumentou e enriqueceu significativamente seus acervos, abrindo-as para todos. Essas eram dirigidas por bibliotecários graduados. Além disto, ao desenhar a estrutura da Secretaria Municipal de Educação e Cultura, criei na estrutura do Departamento de Cultura, a Divisão de Bibliotecas.

 

Realizamos 42 projetos de cultura nas escolas da rede e a céu aberto, vários deles com o objetivo de desenvolver o gosto e o hábito da leitura,

 

Aqui, quero prestar uma homenagem a Martinho de Carvalho, que conduziu com criatividade, competência, coragem e, às vezes, até com audácia, o excepcional trabalho realizado pelo Departamento de Cultura, da Secretaria Municipal de Educação e Cultura da Cidade do Rio de Janeiro, no período de 1975 a 1979.

 

Fecho o pano do passado, ainda recente e vivo na minha lembrança, e apresento o resultado de uma pesquisa recente feita pelo Observatório do Livro e da Leitura, em 503 bibliotecas que revelou que "antes de um livro ser condenado a uma lixeira ou à reciclagem, um livro é lido, em média, 158 vezes". E conclui: "Este número pode dobrar se o livro for de um acervo de biblioteca escolar".

 

As políticas de fomento à leitura de formação de leitores precisam ser centralizadas não apenas nos acervos e no uso dos livros disponíveis nas escolas, mas em garantir a qualidade do trabalho realizado, pelos professores, na leitura e na escrita de seus alunos.

 

Para fazer do Brasil um país de leitores, temos que começar por desenvolver o hábito de ler e estimular outras manifestações culturais nas novas gerações.

 

Há quase um século, Emerson escreveu: "O que melhor podem fazer as escolas, das classes primárias às universidades, é ensinar a ler".

 

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